Guilherme Karsten, um dos 10 indicados para representar o Brasil na Bienal de Bratislava, fala com o Blog da Brinque
19 de Junho de 2019 às 14:05
Originalmente publicado no Blog da Brinque
Tenho como um dogma a tentativa de fazer com que a minha ilustração não seja óbvia, mas que seja companheira do texto, que saiba contar a mesma história de outra forma ou até mesmo contar outra história
BB: O que é ilustrar, hoje? Guilherme: Difícil pergunta, não sei se é hoje, mas tenho como um dogma a tentativa de fazer com que a minha ilustração não seja óbvia, mas que seja companheira do texto, que saiba contar a mesma história de outra forma ou até mesmo contar outra história, mas que corrobore e não atrapalhe. Uma boa ilustração te instiga a novas perspectivas, te faz imaginar além do que está sendo visto ou lido. BB: Você pode comentar um pouco sobre seus processos de criação e inspiração? O que inspira você? Como cria? Como essas inspirações ganham corpo? O que tem mexido com você - em termos de inspiração, arte, técnica, processos, materiais no momento no trabalho de você? Guilherme: Normalmente após ler o texto e entender a história, eu decido de que forma vou trabalhar, digitalmente ou manual (normalmente vou pro computador pois é mais confortável para mim). É hora de deixar a imaginação fluir e a imaginação pode vir de qualquer lugar, numa conversa, numa caminhada, numa refeição... é preciso estar atento. Sempre pesquiso algumas referências de imagens, filmes, músicas, etc., então começo a rabiscar algumas ideias. Confesso que sou um tanto apressado e impaciente, deveria pesquisar mais antes de iniciar os layouts. Agora, quando o livro foi escrito por mim, o processo é muito mais difícil, demoro pra começar a rabiscar. Me sinto meio felino, dou voltas e voltas ao redor do texto, sondo o local, fico ressabiado, até que decido enfrentar, é ruim mas é bom, ou bom mas ruim. BB: Você tem hábitos ou manias na hora de criar ou pensar um trabalho? Guilherme: Uma mania que tenho é de não fazer os layouts para apresentar para o editor. Gosto de iniciar a arte e já finalizar. Mas, como os editores pedem, faço um layout de forma muito sofrível (ao menos para mim) e sempre tenho a impressão de que irão recusar, mas normalmente entendem a ideia :) BB: Você pode contar assim, de bate-pronto, o nome de um livro, de um filme, de uma música, de uma peça de teatro, de um programa de TV e de uma performance (dança, canto, arte de rua...) que tenha mexido com você recentemente? Tudo bem se não tiver um exemplo pra cada, mas a ideia é que seja a primeira que vier à memória. Guilherme: De todas estas artes citadas na pergunta, a que mais mexe comigo, e que mexe comigo profundamente, é a música, muito mais do que cinema, teatro ou mesmo que livros. E gosto de todos os tipo, desde a MPB ao Rock; canto alto, sorrio, choro... injusto citar uma apenas. Mas vou citar um filme antigo que me pegou de jeito: O Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças. E um livro que comprei dias atrás e, como artista visual, comprei combinação capa+ título fortes: O som e a fúria, de William Faulkner, a mais recente edição da Cia. das Letras. Estou na metade do livro, e o jeito como foi escrito é muito interessante. Na próxima entrevista, direi se gostei ou não.Um bom livro ilustrado é aquele onde a gentileza reina, há momentos em que a imagem dá a vez à palavra e há momentos onde a palavra reconhece a imagem como o protagonista
BB: O livro ilustrado vem ganhando cada vez mais apaixonados e mais prestígio também. É, em geral, um livro infanto-juvenil, mas que não agrada apenas aos pequenos. Queria pedir que você comentasse essa relação palavra-imagem, a profundidade de camadas e belezas e como uma conversa entre as duas linguagens enriquece a experiência estética do leitor de todas as idades. Guilherme: Imagens e palavras precisam ser amigas. Um bom livro ilustrado é aquele onde a gentileza reina, há momentos em que a imagem dá a vez à palavra e há momentos onde a palavra reconhece a imagem como o protagonista. E esta conversa precisa ser mediada por um bom design que cria um espaço para ambas, as páginas precisam respirar. E como falei anteriormente, imagem e palavra se completam, não podem ser redundantes, senão o livro torna-se enfadonho. BB: Falando nisso, uma imagem vale mais que mil palavras? Mil palavras deixariam essa entrevista muito longa, resolvi usar uma imagem pra representar ;) BB: Para quem está começando agorinha a mergulhar nesse universo do livro-imagem e da ilustração, o que você recomenda? O que pode ser um bom mapa, ponto de partida, ponto de chegada, guia, amigo de viagem, meio de libertação etc? Guilherme: Muitos livros são lançados todos os dias, é muito difícil saber de tudo o que acontece, o que é ruim e o que pode ser considerado boa literatura Um bom começo é procurar por reviews de livros, blogs e canais de Youtube de contação de histórias, geralmente os conteúdos revisados são bons, desde lançamentos a clássicos. De qualquer forma, livros são bons amigos de jornada, ótimos companheiros. Qualquer ponto de partida de um bom livro é ler e ver o que aparecer a sua frente, o bom gosto vai aparecendo à medida que você degusta novas histórias.Este texto foi publicado originalmente no Blog da Brinque e estava hospedado no site da Brinque-Book. A editora Brinque-Book foi integrada ao Grupo Companhia das Letras em outubro de 2020 e a migração deste conteúdo para dentro do Blog da Letrinhas tem como objetivo somar conhecimentos, unificar os blogs e fortalecer a produção de conteúdo sobre literatura infantil, leitura e formação de leitores.